Como Investigar Acidentes de Trabalho?

 

Como elaborar uma Investigação de Acidente de trabalho?



“(...)Subiu a construção como se fosse máquina, ergueu no patamar quatro paredes sólidas, tijolo com tijolo num desenho mágico, seus olhos embotados de cimento e lágrima, sentou pra descansar como se fosse sábado, comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe, bebeu e soluçou como se fosse um náufrago, dançou e gargalhou como se ouvisse música, e tropeçou no céu como se fosse um bêbado, e flutuou no ar como se fosse um pássaro, e se acabou no chão feito um pacote flácido, agonizou no meio do passeio público, morreu na contramão, atrapalhando o tráfego...”[grifo nosso](Musica “Construção” de Chico Buarque, 1971)

 

Normalmente iniciamos nosso artigo com uma história que ilustre de alguma forma o tema. Mas de que melhor maneira representar um acidente de trabalho do que na canção “Construção” que aludiu brilhantemente o “efeito indesejado” do chamado “milagre econômico” (1968 a 1973) no Brasil?

 

Naquela época vivíamos um período de rápido crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), impulsionado pela industrialização, investimentos em infraestrutura e impulsionado por políticas governamentais expansionistas, mas que gerou grande aumento no número de acidentes de trabalho, especialmente na construção civil; inspirando obras artísticas como essa.

 

De lá para cá muita coisa mudou, mas o cenário de acidentes, em números, está longe de ser o ideal, basta você fazer uma rápida pesquisa no observatório do MP https://smartlabbr.org/sst] ] para ver que os esforços, embora existam, ainda são insuficientes.

 

Mas quando serão?

 

É um dos grandes desafios para os gestores de Saúde e Segurança do Trabalho (SST).

 

Introdução.

 

Para que possamos compreender por qual motivo acidentes de trabalho devem ser investigados e especialmente como fazê-lo, de maneira resguardada, inatacável (tanto quanto possível) e resoluta, é preciso fundamento, sustentação em como é feito.

 

A edificação de qualquer profissional prevencionista deve estar muito bem embasada numa coletânea de referências (fontes) confiáveis e atualizadas que vão muito além do conteúdo das NR, que são só a ponta do iceberg da SST, por isso é sempre importante revisarmos conceitos base, para seguir em frente nesse tema.

 

O conceito de acidente de trabalho, no Brasil, é descrito como “o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ... provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou perda ou redução, permanente ou temporária da capacidade de trabalho” (art. 19 da Lei nº 8213/91).

 

Por estar definido em lei não há discussão do que deve ser entendido como acidente de trabalho, tampouco quais são seus efeitos no trabalhador, porém sua identificação, nos casos concretos, são muitas vezes um desafio para diferentes profissionais. Eis a importância do estudo do conceito.


É importante dizer que o conceito acima é tratado, pelo legislador, como acidente de trabalho típico”, havendo além dele outras possibilidades que possibilitem a classificação, de maneira análoga, que chamamos "acidente de trabalho equiparado". É o caso das doenças ocupacionais.


O conceito de Doenças Ocupacionais, entendemos se, toda condição de saúde, prejudicial, causada ou agravada pelo exercício do trabalho em razão de suas atividades ou condição do meio ambiente do trabalho. A mesma lei que define o acidente e as equipara a ele nos traz duas subdivisões:

  • Doença Profissional - produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade;
  • Doença do Trabalho – Adquirida ou desencadeada em razão da exposição a agentes de risco presentes no ambiente de trabalho, ou seja, onde o trabalho é realizado.

 

Há ainda mais hipóteses de equiparação, tratadas no art. 21 da mesma Lei, por exemplo cuja causa não tenha sido unicamente o trabalho ou seu ambiente, mas esteja a ele relacionado, como os acidentes de trajeto, os atos de agressão ou ofensa física praticadas no ambiente de trabalho, entre outros indicados em seus incisos.
 
    Vale, também, ter em mente outros conceitos como “acidente”, “quase acidente”, “incidente”, “evento adverso”, “circunstância indesejada” que transitam entre a visão prevencionista, legal e normativista do tema, mas que para efeito dessa conversa não precisam ser detalhados, bastando notar que sempre que forem apresentados em uma avaliação devem ser conceituados no léxico ("definições") do documento, preferencialmente, ou ao menos ao longo do texto.
 
    Isso porque a linguagem técnica de SST pode ser bastante abrangente, dada diferentes visões e  correntes autorais (doutrinas), legais (leis, normas e outras portarias) e até mesmo referências internacionais (normativas de padronização). Por isso merecem atenção no seu discurso, especialmente observando a que público você se dirige ao escrever, a fim de afastar duvidas e erros de interpretação.
 
    Sempre que haja dúvida, do profissional responsável pela aplicação dos conceitos legais sobre acidente de trabalho é recomendada a indicação de fonte referencial acreditada. Sempre que a realidade se demonstrar mais complexa do que o esperado é recomendado que decisões sejam elaboradas por um colegiado (equipe), multidisciplinar, sempre que possível, por exemplo SESMT, jurídico, RH, Alta Direção (quando for o caso) de modo que as caracterizações feitas no seu documento sejam criteriosamente feitas.
 

Por que investigar Acidentes de Trabalho?

 

Que melhor maneira de evoluir o nível de consciência de uma organização ou seus trabalhadores do que com ações de conscientização dos mais diferentes aspectos e impactos (positivos por ação, negativos por ausência) da SST?  Essa é a resposta curta para a questão. Vamos a longa...


Um dos conceitos prevencionistas de acidente de trabalho é “evento indesejado”, muito didático já que nele está contido que não havia qualquer intenção ou interesse de sua intercorrência, menos ainda seus efeitos danosos, ao trabalhador e a empresa.

 

Quando um acidente de trabalho ocorre, significa que algo saiu do planejado ou esperado, resultando em danos à saúde física ou mental do trabalhador, seja de forma imediata ou ao longo do tempo, mas que indubitavelmente não deveria acontecer naquele ou em momento algum.


Isso remete a necessidade de revisão do processo produtivo, palco do acidente, de modo a ser identificado o que exatamente deu de errado para que haja um aprendizado a partir disso. Não há como não pensar na indústria aeronáutica, que toma essa postura a décadas e encara toda a coisa como uma questão de ordem urgente para melhorar toda a indústria, não medindo esforços para tal.


Nossa capacidade de aprendizado está profundamente ligada às imagens mentais que formamos a partir das experiências que vivenciamos. A fixação de uma informação está diretamente relacionada à importância que nosso cérebro atribui a ela, podendo ser reforçada por sensações como recompensas ou traumas gerados por estímulos externos.


Um acidente é sempre marcante e potencialmente traumático, não apenas para a vítima, mas também para todos ao seu redor. Por isso, dedicar atenção a ele e analisar minuciosamente cada aspecto envolvido em uma investigação é uma excelente forma de destacar para as pessoas a importância de compreender como ocorreu e, principalmente, como poderia ter sido evitado.


Dessa forma, nossa mente registra os estímulos externos que consideramos relevantes, armazenando-os em nossa memória como aprendizado. Em resumo, o evento se torna algo mais memorável pelas reações a ele, como a investigação, as descobertas advindas dela e especialmente as soluções implementadas a partir desse aprendizado, do que traumatizante pelo fato em si.

 

Investigar minuciosamente um acidente de trabalho é essencial para compreender as causas que levaram a ele. Ao analisar cada detalhe da sequência de eventos, é possível identificar falhas e erros, permitindo que haja aprendizado com essa experiencia e que ele direciona a organização a melhorias significativas no gerenciamento dos riscos ocupacionais.

 

Aprender com os acidentes de trabalho é parte fundamental do todo e a melhor chance de evitar sua repetição no futuro. Lembramos que para isso não é preciso que eles aconteçam, por essa razão acreditamos que a consolidação e compartilhamento de históricos de investigações, entre empresas, é uma possibilidade pouco explorada e com potencial incrível de agregar conhecimento a todos.


Como efeito a investigação do acidente de trabalho resulta em:

·      Prevenção de Recorrências: Entender as causas e circunstâncias do acidente ajudam a sugerir e implementar medidas corretivas reativas para evitar que situações semelhantes se repitam no futuro.

·      Promoção da Segurança: Identificar falhas nos padrões de qualidade esperados nos processos, equipamentos, procedimentos e comportamentos que contribuíram para o acidente permite a melhora no padrão de qualidade das organizações, resultando na melhora da percepção da importância da SST.

·      Redução de Custos e Passivos: De retrabalhos na produção a multas administrativas, processos trabalhistas e até a imagem pública da organização, acidentes de trabalho geram um impacto negativos com custos diretos e indiretos, evidentes e ocultos significativos. Investigar acidentes não resolvem o passado, mas melhoram o futuro e com isso impedem perda de capital: humano, financeiro e de imagem.

·      Melhoria do Clima Organizacional: Demonstra o compromisso com as pessoas, sua segurança e bem-estar, aumentando a confiança e satisfação no local de trabalho. Claro, quando executado corretamente, como veremos adiante.

·      Cumprimento da Legislação: A legislação exige que acidentes de trabalho sejam investigados, muitas vezes por mais de uma equipe (ex. SESMT, CIPA), então ele deve ser encarado como uma obrigatoriedade e não liberalidade.

 

Naturalmente, o maior ganho relacionado aos efeitos desejáveis que levam a uma investigação de acidente é a prevenção de danos a vida do trabalhador, entendendo-se “vida” no sentido amplo de existência, profissional, privada, enfim social.

 

Acidentes do trabalho corretamente investigados e regularmente combatidos (quanto a sua ocorrência e não registro) devem ser encarados acima de tudo como  LIÇÕES APRENDIDAS.

 

O eventual compartilhamento dessas lições iniciaria uma corrente do bem, de trocas de conhecimentos que levam essa experiencia a outros trabalhadores e empresas, e potencial chances aumentadas  de evitar o cenário nacional, expresso no Observatório do MP. Não cansamos de repetir.

 

Como investigar Acidentes de Trabalho?

 

Chegamos ao ponto central desse artigo, como investigar, de forma fundamentada, eficaz e eficiente acidentes de trabalho. Mas antes é importantíssimo que o profissional de SST tenha em mente que cada cenário demandará diferentes soluções.

 

Por essa razão não temos a pretensão de apresentar ferramentas de investigação de acidente tradicionais, tampouco ditar regras sobre o que está certo ou errado, mas sim afastar a dúvida de muitos ao organizar sua coletânea particular de referencias para melhor aproveitar seus conhecimentos ao iniciar o processo de investigação.

 

Então, seremos bastante abrangentes quanto a construção do raciocínio, de modo que você possa escolher a melhor ferramenta a ser utilizada quando chegar a hora, mas que o faça de forma consciente, com método claro, repetível, rastreável, analítico e baseado em evidências.

 

Com Isso, queremos deixas claro que nosso objetivo é apoiá-lo na gestão do processo de investigação de acidente, de modo a compreender que “não é por acaso” que nenhum acidente acontece, mas sim pela ligação previsível e prevenível de diferentes fatores que resultam nele (acidente).

 

Sua investigação de acidente deve ser sistematicamente organizada de modo que todas as ações nela contida sejam rastreáveis, repetíveis, manuseáveis e escaláveis, dessa maneira, ao garantir tais características é possível aumentar o nível de eficiência, eficácia e credibilidade da investigação como um todo.

 

Vamos entender cada característica:

·      Rastreável: Significa que cada ação tomada seja registrada de forma que seja possível acompanhar e entender todo o histórico do processo de investigação. Isso inclui documentar cada etapa seguida de dados coletados, análises realizadas, referencias utilizadas e conclusões alcançadas.

·      Repetível: A investigação deve ter a capacidade de reproduzir as mesmas ações e procedimentos em circunstâncias semelhantes, demonstrando ser estruturada e padronizada de maneira que possa ser seguida novamente, garantindo consistência e imparcialidade na coleta de dados, na análise e conclusão. A repetibilidade é importantíssima para assegurar que a investigação foi conduzida de maneira uniforma e eficaz em diferentes situações.

·      Mensurável: A capacidade de qualificar ou quantificar os dados da investigação de modo objetivo. Para isso é importante definir métricas e indicadores a serem utilizados na avaliação, aqui sua metodologia de preferência (Diagrama de Ishikawa, Árvore de causas, RCA, Bowtie, HELM, etc.), ou mais indicada para aquele cenário, deva ser escolhida. Métodos auxiliam especialmente na coleta de dados e análise desses, criando evidências para tomada de decisões, este é o foco.

·      Escalável: aplicar e adaptar o processo de investigação a diferentes contextos e escalas, demonstrando sua flexibilidade e suficiência em trabalhar frente a diferentes cenários de acidente, suas gravidades e equipes de trabalho demonstra como o processo pode ser ampliado ou reduzido conforme complexibilidade, sem comprometer sua eficácia.

 

É importante ter em mente que seja um profissional, apenas, ou múltiplas equipes multidisciplinares, envolvidos em uma investigação de acidente é fortemente recomendado que essas características estejam sempre presentes.

 

Etapas de uma investigação de acidentes de trabalho.

 

A segmentação em etapas auxilia o profissional a visualizar melhor cada momento, focar em como deve proceder e quanta energia deve dispor. Sempre que falamos em segurança do trabalho não cansamos de citar o ciclo PDCA, que aqui serve de perfeito exemplo da importância em dividir em etapas claras qualquer processo.

 

A partir desse ponto vamos ao momento em que se toma conhecimento do acidente, que deve inicialmente ser identificado por magnitude dos riscos envolvidos para se determinar o grau de urgência da realização de uma análise. Aqui observe o prazo legal de 24 horas úteis para abertura de CAT, que difere da investigação em si por ser um “comunicado de acidente de trabalho”.

 

Qualquer acidente deve ser investigado prontamente, haja vista que demonstra fragilidades de segurança de processos e especialmente por envolver pessoas. Outro elemento importante a ser observado é que a coleta de dados deve considerar a perda de informações com o passar do tempo, por exemplo considerando a memória dos trabalhadores que serão fontes de informação.

 

Uma investigação de acidente deve abranger todos os dados disponíveis de modo a esclarecer cada elemento do evento que possam levar a uma conclusão simples “houve uma falha que levou a...”, “essa série de fatores se uniram resultando em...”, “ o elo de ligação, entre tantos outros que contribuíram para o acidente foi (ou foram)...”.

 

As principais etapas para investigar um acidente de trabalho incluem:

1.   Organizar as informações coletadas e formular hipóteses explicativas;

2.   Analisar todos os dados disponíveis na cena do evento, identificação da(s) vítima(s) e companheiros de trabalho (testemunhas em potencial), bem como informações documentais [PGR (inventário de riscos, Planos de ação), POP e procedimentos, outros programas aplicáveis];

3.   Escolher o método de análise mais adequado para o evento investigado, admitindo a possibilidade de adaptações, inclusões de métodos acessórios (exemplo o 6M no diagrama de Ishikawa).

a.   A depender da dimensão (gravidade, complexidade) do acidente será necessária a convocação de equipe multidisciplinar que auxilie no todo ou pontualmente a investigação. Aqui o papel de cada profissional deve ser claramente estabelecido.

4.   Coleta de dados em campo, entrevistas com pessoas envolvidas no acidente e demais ações que permitam a o evento seja descrito com riqueza de detalhes que permita a identificação de cada fator que levou ao evento indesejado.

5.   Compilação e análise dos dados, com elaboração de relatório descritivo e detalhado de cada fator da cadeia de eventos, bem como os elos de ligação entre eles e os identificados quanto a criticidade, relevância e chance de nova ocorrência.

6.   Elaboração de conclusões, didáticas, sobre como a cadeia de eventos fechou o ciclo do acidente possibilitando sua ocorrência.

7.   Sugestão de pontos de melhoria que visem evitar novas ocorrências dessa natureza, até mesmo com maiores dimensões.

 

Examinar o histórico de investigações de acidentes, não apenas da empresa, mas todo aquele que for acessível para a equipe envolvida, é de extrema importância e deve ser incluso na base da análise sempre que possível. Afinal em experiencias anteriores, mesmo de outros estabelecimentos de sua empresa, de empresas de seu segmento ou mesmo conhecidos na literatura prevencionista podem conter noções ou informações chave pra sua investigação.

 

Imparcialidade também é elemento chave em investigações de acidente, isso porque posturas inquisitórias e auditorias tendem a despertar nos trabalhadores condutas defensivas que levam a enviesamento de informações e equívocos na coleta de dados. Aqui o grande segredo é nunca falar de culpados, mas sim de acontecimento, procedimento e outros fatos impessoais.

 

Descarte a teoria dos dominós, que sugere que um único ato desencadeia uma sequência de eventos que culminam no acidente. Na realidade, isso não é tão simples, pois os acidentes geralmente resultam de uma complexa interação de diversos fatores e ocorrências, muitas vezes não lineares, que se combinam para produzir eventos indesejados.

 

Para ilustrar, o que queremos dizer, vamos nos valer de um interessante trecho de uma adaptação de uma obra de F. Scott Fitzgerald, adaptado para o cinema e que tem um texto intitulado “Rota de colisão” que descreve com detalhes como uma conjuntura de eventos aparentemente desconectados levaram a um acidente:


"Às vezes estamos numa rota de colisão e nós não sabemos. Seja por acidente o intencional, não podemos fazer nada a respeito.

Uma mulher em Paris estava indo fazer compras. Mas ela esquecera seu casaco e voltou para pegá-lo; quando ela pegou seu casaco, o telefone tocou e ela resolveu atender e conversou por alguns minutos.

Enquanto ela falava ao telefone, Daisy estava ensaiando para uma apresentação na opera House de Paris e, enquanto ela ensaiava a mulher após o telefonema, saiu para pegar um táxi.

Um taxista deixou um passageiro mais cedo e parou para tomar uma xícara de café. Enquanto isso, Daisy estava ensaiando.

E este taxista que deixou um passageiro mais cedo e tinha parado para tomar uma xícara de café, ele pegou a mulher que estava indo fazer compras e que não pegou o taxi mais cedo.

O táxi teve que parar, um homem atravessou a rua, saindo do trabalho 5 minutos mais tarde do que de costume, porque esqueceu de ajustar o seu despertador.

Enquanto aquele homem estava atravessando a rua; Daisy terminou de ensaiar e estava tomando um banho.

Enquanto Daisy tomava banho; o táxi esperava pela mulher pegar um pagode que ainda não fora embrulhado; porque a moça que devia embrulhá-lo rompeu com seu namorado na noite anterior e esqueceu.

Quando ele estava embrulhado, a mulher, que tinha voltado ao táxi, foi bloqueada por um caminhão de entrega. Enquanto isso, Daisy estava se arrumando.

O caminhão de entrega se afastou e o táxi pôde seguir em frente, enquanto Daisy, a última a se arrumar, esperava pela amiga dela, cujo cadarço arrebentara.

Enquanto o táxi estava parado esperando o sinal abrir, dance e sua amiga saíam pelos fundos do teatro...

Se ao menos uma coisa tivesse ocorrido diferente, se o cadastro não tivesse arrebentado ou se o caminhão de entrega tivesse se afastado antes ou se o pacote tivesse sido embrulhado antes porque a moça não rompera com seu namorado ou se aquele homem tivesse ajustado seu despertador e acordado 5 minutos antes ou se o taxista não tivesse parado pra tomar uma xícara de café ou se a mulher tivesse se lembrado do casaco mais cedo...

Daisy e sua amiga teriam atravessado a rua e o táxi não a teria atropelado...

Mas, sendo a vida como ela é: uma série de eventos e incidentes interligados, que não se pode controlar, aquele táxi não passou direto e o motorista teve o momento de distração e o táxi atropelou Daisy e quebrou a perna dela." (O curioso caso de Beijamin, adaptação cinematográfica de Eric Roth e Robin Swicord, 2009)

 

Discordamos dos autores quanto a “não podemos fazer nada a respeito” ao menos no que diz respeito a ambientes do trabalho, onde, em tese, todas as tarefas e rotinas laborais são planejadas de algum modo e espera-se que haja alguma padronização delas para que se garanta a qualidade do produto ou serviço e não haja acidentes.

 

No mais, o texto ilustra brilhantemente como uma cadeia de eventos, até mesmo aparentemente desconexos entre si, podem se juntar de alguma forma. Quando isso acontece, nada mais necessário do que entender como tudo ocorreu e especialmente como evitar novas ocorrências.

 

Cabe aqui um exercício mental: Como, no cenário do acidente de Daisy poderíamos   realizar uma investigação que resultasse em um relatório tão bem elaborado, claro e direto como o do texto?

 

Em investigações de acidentes o objetivo não está em apenas listar os fatores identificáveis de um acidente, mas sim em compreender como eles se conectaram e possibilitaram esse evento indesejado.

 

Causas e Efeito(s) devem ser conectados além do óbvio, mas de forma clara, transparente e logica para que a conclusão seja correta e, portanto, subsidie medidas preventivas que evitem novos acontecimentos dessa natureza ou até mesmo de mais graves, a depender do que foi apurado e concluído. E acreditem, não é fácil e menos ainda intuitivo!

 

Coleta de dados e análises parciais ou apressadas levam a conclusões adversas daquela que represente a realidade dos fatos, por isso jamais inicie uma investigação supondo que já sabe dos fatos, motivações ou desvios de padrão que levam a tal ou qual tipo de acidente. Antes de completar a análise não deve haver conclusões precipitadas.

 

Por fim, sabendo-se a causa é possível buscar soluções que melhorem o trabalho (processo ou ambiente) de modo que as chances de novos acidentes daquele tipo sejam minimizadas de maneira substancial.

 

Nesse ponto é importante rever sua classificação de riscos, quanto a possibilidade ou chance de ocorrências antes do acidente e depois das melhorias recomendadas. Havendo sempre, é claro, a participação dos trabalhadores e/ou seus representantes em todas as etapas.

 

Conclusão.

 

Investigar acidentes de trabalho é mais do que apenas uma obrigação legal ou uma formalidade burocrática. É uma oportunidade valiosa para aprender com os eventos indesejados, compreender as complexas interações de fatores que levaram ao acidente e implementar medidas preventivas eficazes para evitar sua repetição no futuro.

 

Ao longo deste texto, arranhamos a superfície do tema, compilando muito brevemente a importância e a sistemática necessária, que recomendamos fortemente seja, envolvida em suas investigações, baseada em evidências e centrada na compreensão das causas raiz. Desde a coleta inicial de dados até a elaboração de conclusões e sugestões de melhorias, cada etapa desse processo requer diligência, imparcialidade e rigor analítico.

 

Além de cumprir com as exigências legais, a investigação de acidentes oferece inúmeros benefícios para as organizações, incluindo a prevenção de recorrências, a promoção de um ambiente de trabalho mais seguro, a redução de custos e passivos, a melhoria do clima organizacional e o cumprimento das legislações vigentes.

 

Portanto, ao encararmos os acidentes de trabalho como oportunidades de aprendizado e aprimoramento contínuo, podemos criar ambientes de trabalho mais seguros, saudáveis e produtivos para todos os envolvidos. A investigação de acidentes não é apenas uma responsabilidade, mas sim um compromisso com a segurança e o bem-estar dos trabalhadores, refletindo o comprometimento da organização com a excelência em saúde e segurança ocupacional.

 

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Referências:

 

Almeida IM. A gestão cognitiva da atividade e a análise de acidentes do trabalho. Rev. Bras. Med. Trab., Belo Horizonte vol.2 out-dez; 2004

BRASIL, O que é acidente de trabalho? Site Tribunal Superior do Trabalho (TST) link https://tst.jus.br/web/trabalhoseguro/resolucao acessado em 03 de abril de 2024.

_______, Guia de Análise Acidentes de Trabalho. Ministério do Trabalho e emprego, Secretaria de inspeção do Trabalho, departamento de segurança e saúde do trabalho. Imprensão, Brasília, 2010.


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