O que é o PAE?

  O que é o PAE?



"Espere pelo melhor, se prepare para o pior" provérbio chinês.

Introdução

José trabalhou na linha de produção por mais de 15 anos e “nada de errado” aconteceu com ele ou seus colegas, o que o fez acreditar que nada jamais aconteceria, pois “isso são estórias que acontece com os outros!”, dizia ele ter proteção de “forças maiores”, conforme sua fé.

Seu empregador pensava igual, mas por conveniência, afinal, investir em cenários de emergência é “dinheiro desperdiçado com algo que pode nunca acontecer!”, dizia sempre a seus vizinhos de pátio fabril e aos encarregados da pequena fábrica de químicos.

Acontece que lições nem sempre são fáceis de serem aprendidas, pois pela falta de um Plano de Atendimento a Emergências (PAE) num fatídico fim de expediente, num dia seco e quente, um vazamento de inflamável encontrou uma fagulha elétrica e tomou todos de surpresa.

Foi somente quatro dias depois com todo o pátio industrial destruído pelas chamas, que em meio a toda agitação, correria, sirenes e ainda com os bombeiros fazendo rescaldo de alguns escombros, que José, entrevistado por uma TV local, apontando para o céu reconheceu que só a força do PAE poderia ter evitado toda essa destruição.

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Gerenciamento de Riscos Ocupacionais e PAE

Em qualquer sistema de gerenciamento de riscos, em especial o ocupacional (GRO ou SGSSO), identificar perigos e inventariar riscos é essencial para propor medidas de ação que eliminem, mitiguem, controlem ou ao menos monitorem eles, com algum nível de controle.

Em Saúde e Segurança do Trabalho (SST) costumamos usar o conceito de risco com as variáveis probabilidade ou chance de uma ocorrência ou evento indesejado, com potencial de causar danos e perdas (de pessoas e patrimônio), mas tendo a incerteza como constante.

Riscos são geralmente avaliados por ferramentas utilizadas na SST, que unem análises de dados existentes, evidências coletadas e trazendo consequências previsíveis e suas gravidades para essa equação de modo a identificá-los, dimensioná-los e controlá-los.

Nesse sentido, nossa Norma Regulamentadora nº1 (NR01) ressalta a importância de gerenciá-los, dizendo mais ou menos como identificá-los e estabelecendo uma hierarquia de como mitigá-los. Mas ela também traz outras obrigações às Organizações, que tem a ver com nosso tema: A Preparação para emergências (item 1.5.6 da NR01).

 No Brasil, atualmente, é estabelecido que toda a empresa deva se questionar sobre os riscos que sua atividade econômica pode trazer para os trabalhadores, que de forma direta os atingem (lesões, doenças), devendo ser gerenciados pelo GRO. É interessante colocarmos aqui que o empregador também é afetado diretamente, já que terá o dever de indenizar, responder criminalmente por sua conduta, entre outros efeitos jurídicos possíveis.

Isso acontece por meio do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) que deve, no mínimo, apresentar um “inventário de riscos” e um “plano de ação” (NR01 1.5.5.1). Até aqui todos estamos muito bem alinhados. Mas há nele outra obrigação ser cumprida, a do item 1.5.6.

A “Preparação para emergências” é uma obrigação estabelecida pela norma regulamentadora brasileira para as organizações, que devem “estabelecer, implementar e manter procedimentos de respostas aos cenários de emergência, de acordo com os riscos, as características e circunstâncias das atividades.”

"Riscos", "características" e "circunstâncias", note que aqui estamos indo além do inventário de riscos do PGR, afinal se perigo é a fonte e risco é a interação entre o trabalhador e o perigo (lembra dos desenhos de leões, tubarões, jacarés, gaiolas e pessoas?) então, quando observamos os outros dois fatores desse trio nós vamos além.

É aqui que saímos de fato do mero (com todo respeito) inventário de riscos e vamos para os cenários de emergência, que sim considera o primeiro, mas vai adiante, observando toda cadeia de valores envolvidas naquela atividade econômica analisando e buscando outros contextos indesejados.

Para ilustrar, vamos a três modelos de situação que apresentem "riscos", "características" e "circunstâncias"  que o PAE deve analisar e propor respostas:

Para "riscos" imagine que seu PGR inventaria o risco ocupacional gerado por trabalho em altura e ele propõe medidas como eliminar a necessidade do trabalhador subir, utilizar equipamentos de elevação (ex. uma PTA) ou mesmo o clássico ponto de ancoragem e EPI típicos (cinto paraquedista e conjuntos).

Nesse ponto, o PGR cumpre seu papel, inventaria o risco e apresenta o plano de ação, mas e se ao usar uma PTA ele fica "preso" lá em cima, pendurado ou sofre qualquer mal súbito? E se ancorado pelo sistema de proteção contra quedas um evento qualquer o aprisiona, pendurado nas alturas? Imagine qualquer outra situação de emergência relacionada.

Bem, é aqui que o PAE atua, pois identifica esses cenários e apresenta reações a ele. Como observação, note que no caso da NR35 deve haver um Plano de Proteção Contra Quedas (PPCQ) associado a permissão de trabalho (PT) que libera a subida.

Para "características" você pode visualizar um ambiente de trabalho onde haja formação de atmosferas explosivas (por gases, vapores ou poeiras) ou outro que lida (armazena ou transporta) materiais contaminados. 

Mesmo com medidas prevencionistas que visem o controle dos seus riscos associados, que podem existir mesmo na ausência do trabalhador é necessário conceber que pelas características dos materiais existentes ali possa haver uma ocorrência que leve a uma emergência, como incêndio, um vazamento ou outras ocorrências de natureza ambiente e/ou sanitária.

O Plano de Atendimento a Emergências, ao ser elaborado deve contemplar esses cenários, considerando também as características do que há naquele ambiente, pode ser um inflamável, um contaminante, um material volátil ou até mesmo um animal perigoso, de modo a prever possibilidades e apresentar reações. 

Para "circunstâncias" leve sua imaginação a trabalhar, qualquer possibilidade de ocorrência previsível que pode levar a uma necessidade de resposta rápida a um cenário de emergência, como um transeunte sofrendo um mal estar (ex. infarte) em um ambiente de grande circulação de pessoas como aeroportos ou metrôs; um foco de incêndio em um escritório ou qualquer outra situação circunstancial.

É em circunstâncias que, ao meu ver, o prevencionista responsável pela elaboração do PAE deve contar, mais do que nunca, com auxílio externo, participação de trabalhadores e outros profissionais da equipe que atua nos trabalhos de sua elaboração, o que nos leva a citar a NBR 15219:2020. 

 

A ABNT NBR 15219

A ABNT NBR 15219 trata sobre  diretrizes, requisitos e procedimentos para elaboração, implantação, manutenção/atualização e revisão do PAE, nas organizações que adotam essa importante normalização de referência para o tema.

Ela tem como principal objetivo assegurar, quando bem aplicada, que as ações do PAE garantam a segurança das pessoas (trabalhadores e outros), a preservação do meio ambiente natural e a continuidade das operações em cenários de emergência relacionados a incêndios.

 Os princípios  gerais encontrados nela são:

    • Adoção de medidas de prevenção (evitar) contra ocorrências;
    • Implemento de medidas de preparação e resposta a emergências;
    • A garantia da segurança das pessoas, bens e ambiente;
    • Formação de equipes aptas e responsáveis pela gestão de crises;
    • Identificação de cenários de emergência mais comuns e relevantes;
    • Realização de treinamentos periódicos para as equipes de emergência;
    • Constante atuação do plano de emergência, no dia  a dia da empresa.

 

Alguns dos principais parâmetros que ela apresenta é a formalização do plano de emergência, pela organização, com suporte de equipe multidisciplinar de especialistas (p. 9) de modo a compor objetivamente aspectos relevantes e metas atingíveis, tais como:

    • Classificação do tipo de ocupação (a atividade econômica da organização);
    • Riscos identificados e associados a ocupação (como os inventariados no PGR ou outros laudos/estudos/programas correlatos);
    • Especificação de aspectos da edificação, como materiais de acabamentos revestimentos e estrutura;
    • Detalhamento da área total da edificação, altura, quantidade de pavimentos, existência de andares de subsolo e outros detalhes de compartimentação vertical ou horizontal;
    • Apresentação do número de população fixa no local e estimativa da flutuante, discriminando perfis como idade, existência de pessoas com deficiência (PCD) ou mobilidade reduzida e outros relevantes a se considerar;
    • Horários de funcionamento, considerando turnos de trabalho, expedientes e dias em que haja atividades no local;
    • Mapeamento de áreas de acessibilidade para PCD ou com mobilidade reduzida;
    • Definição e mapeamento de rotas de fuga e áreas seguras para refúgio;
    • Dimensionamento e formação de equipes de emergência, de brigada de incêndio, suporte e apoio, com definições claras de papeis e responsabilidades;
    • Inventário materiais, equipamentos e sistemas de combate a incêndio, como hidrantes, extintores, escadas de fuga, iluminação de emergência, saídas de emergência, entre outros;
    • Caracterização da circunvizinhança, considerando também localização e disponibilidade de recursos externos para combate, atendimento a emergência, tempo de resposta e atendimento, como localização do corpo de bombeiros mais próximos, hospitais, defesa civil, empresas que possam compor um plano integrado, ente outros.

É interessante dizer que esses parâmetros estabelecidos devem ser sempre claramente formalizados no plano, ser utilizado como material de treinamento de equipes designadas e de conhecimento do maior número de trabalhadores e outras pessoas que frequentam o local possíveis. 

Formando, assim, um conjunto adequado (para o local) de regras, equipamentos de combate, sistemas de alarme, rotas de fuga e procedimentos de evacuação, atendimento de resgate e auxílio, entre outras considerações sejam amplamente divulgados para melhorar tempo e eficácia de resposta a crises e cenários de emergência.

Lembrando que todo plano de resposta de emergência tenha responsáveis designados e claramente identificados, sendo garantido com ele e a ele o acesso rápido a informações de situação, tal como classificação da magnitude potencial do sinistro, protocolos de identificação e resposta, organograma de equipes de emergência, tecnologias de comunicação, como contato por rádio ou telefone com órgãos públicos de atendimento etecetera.

Também que todo programa de atendimento a emergência deve ser composto por cronograma de ações que incluam verificações periódicas em procedimentos, sistemas de alarme, tempos de resposta e simulados de evacuação de áreas.


Outras Referencias normativas

A NBR 15219, como mencionado em seu escopo, tem como foco situações de resposta a emergências contra incêndios, mas há outras interessantes referencias que podemos citar como:

    • ABNT NBR 15292:2013 - Plano de resposta a emergências em aeródromos;
    • ABNT NBR 15498:2019 - Planos de emergência e contingência para barragens;
    • ANSI/ASIS SPC.1-2009 (R2015) - Norma para Planejamento de Continuidade de Negócios e Preparação para Emergências
    • NFPA 1600 - Padrão para Planos de Continuidade de Negócios/ Emergência e Gerenciamento de Desastres;
    • NFPA 99:2018 - Código de Instalações de Saúde - Gestão de Emergências em Instalações de Saúde.
    • ISO 22320 - Gestão de Emergências - Diretrizes para Planejamento de Incidentes e Resposta; 
    • ISO 22301 - Segurança e Continuidade de Negócios - Sistema de Gestão de Continuidade de Negócios - Requisitos; 
    • ISO 22324:2015 - Gestão de Emergências - Diretrizes para Comunicação de Emergência
    • ISO 22320:2018 - Gestão de Emergências - Diretrizes para Planejamento de Gerenciamento de Emergências;
    • ISO 31000 - Gerenciamento de Riscos - Princípios e Diretrizes.

Todas excelentes referências para que você possa, com o pessoal adequado, compor sua equipe de planejamento e implementação do PAE, identificando cenários de emergência e propondo, testando (treinando) e aprimorando melhores respostas a eles.


O ciclo de gerenciamento continuado de emergências

Se você chegou até aqui notou que a maioria das normas são focadas nos cenários mais clássicos de desastres, associados a incêndios e explosões, mas na sua organização podem haver outros possíveis e seu PAE deve contemplá-los. 

Fora o exemplo de trabalho de altura que citamos anteriormente podemos demonstrar com outro exemplo característico (pelos materiais) e circunstancial (pelo ciclo de trabalho) que é a manipulação (de qualquer natureza) de produtos químicos que podem ser inalados ou ingeridos, gerando danos como queimaduras químicas ou intoxicação.

No cenário de emergência que envolvem produtos químicos, sua maior aliada para criar internamente um plano de respostas são as chamadas Fichas de Instrução de Segurança de Produtos Químicos (FISPQ) que contêm informações essenciais para primeiros socorros, além do contato com o fabricante.

Muitos outros modelos de situação podem ser propostos, como trabalhos em espaços confinados, trabalhos em silos de grãos (risco de engolfamento), trabalhos submarinos, com animais peçonhentos ou silvestres, com materiais incandescentes, com máquinas e equipamentos de todo tipo, a lista é gigantesca e os cenários quase infinitos.

Esta é a principal importância do PAE não ser elaborado por apenas um profissional, mas sim por uma equipe, com expertises e visões diferentes. 

Mas é possível sistematizar todo esse conhecimento em uma abordagem geral, utilizando o melhor dessas normatizações para criar uma abordagem poderosa de gerenciamento de emergências, basta unir tudo isso com uma ferramenta da qualidade, mais sensacional criada e adaptada para a SST: o PDCA. 

Com ele podemos compor o que chamamos didaticamente de ciclo de gerenciamento continuado de emergências (do inglês Emergency Management Continuum) um processo contínuo onde o ambiente de trabalho é analisado, as lideranças são engajadas em esforços coordenados, os riscos são avaliados, pessoas treinadas e simulados realizados, aumentando assim a capacidade de resposta de todos os envolvidos, resultando na melhoria de performance em crises. Vejamos:


Nessa leitura do PCDA, adaptado para gestão continuada de emergências, o Planejamento se inicia com a antecipação dos cenários, em um brainstorming ou outro método coletivo de conjugação de visões e expertises; dessa sinergia nasce a previsão de cenários e o PAE. 

As respostas serão compatíveis com os cenários apresentados, as prioridades estabelecidas, os responsáveis designados, todo o fluxo que vimos anteriormente nos parâmetros e princípios. Não se engane, essa fase é realmente desafiadora, afinal há pessoas envolvidas e, portanto, diferenças.

Dessa primeira etapa ainda, é importantíssimo ressaltar, nascem os ciclos de treinamentos periódicos e simulados, fundamentais para que a resiliência da equipe envolvida aumente  e pelos simulados para que o comportamento do público alvo seja preparado para literalmente ir na direção certa.

Havendo a emergência, a resposta da sua organização será assertiva, rápida e eficaz, minimizando o potencial destrutivo ou ofensivo dela de modo a controlar dados e proteger pessoas, o meio ambiente e seu patrimônio. 

Então é hora de reconstruir, recuperar-se dos prejuízos inevitáveis (porém reduzidos, afinal você se preparou) desse cenário, o que demanda gerar balanços de danos, recuperação de perdas e enfim continuidade das operações. 

Por fim, toda sua experiência em lidar com uma situação real irá se tornar foco para que a prevenção que continuamente irá reduzir ainda mais riscos e mitigar eventuais danos envolvidas

 É aqui que enceramos nosso breve resumo sobre Plano de Atendimento a Emergências, como vimos ele é uma ação extremamente importante, mas como tudo em segurança ocupacional não faz falta alguma até que seja absolutamente necessário! Por isso, considere MUITO cumprir a legislação e ter um compatível com sua atividade econômica, atualizado e integrado ao seu GRO.

 

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Referências:

 

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT) ABNT NBR 15219:2020

Plano de emergência — Requisitos e procedimentos, publicada em 16/04/2020

BRASIL, Ministério do Trabalho e Previdência,  Portaria MTP n.º 4.219, de 20 de dezembro de 2022 22/12/22 - Norma Regulamentadora nº 01, 2022.



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